Não será este o momento de as empresas mais responsáveis do setor petrolífero se comprometerem a investir todo o "dinheiro extra" dos elevados preços do crude na sua estratégia de energias renováveis, reforçando assim qualquer tipo de planos que já tenham anunciado?
Artigo de Nuno Moreira da Cruz - Diretor Executivo do Center for Responsible Business & Leadership da Católica Lisbon School para o Jornal de Negócios , 5 de Março de 2022
A Rússia lançou na semana passada uma invasão militar em larga escala à Ucrânia e os combates já causaram mais de 2000 mortos civis e empurraram centenas de milhares de ucranianos refugiados para os países vizinhos.
As consequências económicas terão um grande impacto financeiro em todo o mundo - desde a disponibilidade de alimentos até ao custo da energia. A Europa já está a pagar preços elevados da energia e dos combustíveis e espera-se que o conflito os impulsione ainda mais e já fez com que o preço do petróleo saltasse para o seu nível mais alto em mais de sete anos, enquanto os preços futuros do gás aumentaram 60% em apenas um dia. A Rússia é o segundo maior exportador de petróleo bruto e o maior exportador mundial de gás natural, vital para aquecer casas, alimentar aviões e encher carros com combustível. E vale a pena recordar que a UE se abastece quase metade do seu gás da Rússia.
No sector alimentar, ambos os países exportam cerca de um quarto do trigo mundial e metade dos seus produtos de girassol, como sementes e óleo. A Ucrânia vende ainda muito milho a nível global e a guerra afetará a produção de cereais e muito provavelmente duplicará o preço do trigo.
Neste contexto, qual deve ser o papel das Empresas Responsáveis? Este é mais um “teste de ácido” para muitas empresas, justamente quando o mundo está a emergir de uma pandemia global onde esse teste era já muito real. O que aprendemos com a pandemia é que muitas empresas realmente passaram no teste provando que ser um Negócio Responsável faz parte das suas estratégias e qualquer tipo de crise só pode ajudar a reforçar o seu posicionamento.
E a verdade é que a resposta do mundo corporativo a esta invasão tem sido verdadeiramente impressionante, atuando com a consciência clara de que as “sanções económicas” do mundo empresarial podem também ser devastadoras.
São tantos os exemplos, de tantas empresas, vindas de tantas industrias e geografias que seria injusto citar apenas algumas. São os momentos de crise que permitem distinguir o trigo do joio e a resposta corporativa traz em si mesmo algo muito importante de realçar: uma das grandes barreiras à implementação de "Responsible Business" é o eterno conflito de gestão entre curto e longo prazo e isto está a ser genuinamente testado neste momento. Este debate ganha uma nova e significativa luz em momentos de crise como os que vivemos, exacerbados por uma pandemia e uma invasão militar. São estes os momentos em que o mundo corporativo deve refletir sobre esse conflito de gestão – e essa reflexão, neste momento e neste contexto, está a acontecer em muitos centros de decisão corporativos.
Este não é o momento para hipocrisias e ter sempre um juízo critico, quando a verdade dos factos nesta altura é que o grande parte do mundo empresarial está de facto a privilegiar o longo prazo em detrimento do curto. A esmagadora das decisões que temos visto afetam clara e diretamente o resultado das empresas e o valor curto prazo para os acionistas. A Cesar o que é de Cesar: chapeau para a esmagadora maioria das decisões corporativas que todos testemunhámos esta semana!
Deixo apenas um desafio à indústria que mais beneficia indiretamente deste conflito: não será este o momento de as empresas mais responsáveis do sector petrolífero se comprometerem a investir todo o "dinheiro extra" dos elevados preços do crude na sua estratégia de energias renováveis, reforçando assim qualquer tipo de planos que já tenham anunciado?
Esta é mais uma oportunidade histórica para as Empresas Responsáveis se posicionarem do lado certo da História – e uma vez mais a bem das Pessoas e do Planeta!
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