Formar líderes responsáveis, com ética e humildade. Será este o segredo do êxito das novas empresas, mais sustentáveis e alinhadas com o futuro, segundo um estudo da Católica-Lisbon apresentado em Lisboa
Artigo no jornal Expresso no dia 25 de novembro de 2022, escrito pelo jornalista André Rito
Nuno Moreira da Cruz encontrou há uns tempos um velho amigo do mundo empresarial, que estava afastado dos negócios há mais de dez anos. No meio da conversa, o velho amigo disse uma frase que ficou no ouvido do diretor executivo do Center for Responsible Business & Leadership da Católica-Lisbon. “Os temas que eram tradicionalmente dos ativistas são agora os temas focados pelos investidores.” A ideia ilustra bem um dos pontos fulcrais do relatório “Liderança Responsável: Em que consiste e que caminho para Portugal?”, apresentado ontem. “Sem lucro não há preocupações ambientais, mas sem estas preocupações presentes, hoje, também não há lucro”, afirma ao Expresso Moreira da Cruz, um dos autores do estudo.
Com uma experiência de 35 anos a liderar empresas, o responsável da Católica-Lisbon simplifica a ideia do amigo numa frase: “Um líder tem que ser capaz de transformar a sua empresa. Ou seja, torná-la sustentável do ponto de vista ambiental e social e ter estas características no centro da sua estratégia. Não pode apenas focar-se no lucro, porque sem uma abordagem holística, multifacetada e que tenha todos os atores no centro da equação, não existe retorno.” A responsabilidade social e sustentabilidade são fatores cada vez mais determinantes no sucesso das organizações.
Partindo de dezenas de questionários e entrevistas realizadas a diferentes líderes empresariais portugueses, o estudo da Católica-Lisbon, que durou um ano a ser finalizado, elege cinco categorias fundamentais para o que considera ser um “líder responsável”: ética, honestidade, autenticidade, ser fonte de inspiração, e a humildade. “Como dizia ontem, durante a conferência, João Pedro Tavares, presidente da Associação Cristã de Empresários e Gestores, choca que tenhamos que adjetivar a palavra liderança, porque esta já implica responsabilidade, o mesmo se aplicando à ética e honestidade, e a capacidade de inspirar. Caso contrário não somos capazes de influenciar positivamente os outros. O mesmo acontece se não tivermos honestidade intelectual e humildade, que se traduz na capacidade de falar com os outros”, afirma Moreira da Cruz.
País de doutores e engenheiros
Levado a cabo pelo Center for Responsible Business & Leadership da Católica-Lisbon, o estudo procura desenvolver com rigor científico o conceito de liderança. Os investigadores concluem que estes só podem ser alcançados quando as organizações forem geridas por líderes responsáveis. Mas será que Portugal tem acompanhado a formação e desenvolvimento deste tipo de dirigentes?
“Sinto as coisas a mudar em Portugal, mas há muito para fazer. Falámos com muitos CEO e encontrámos um pouco de tudo, desde lideranças mais antigas às mais profissionais. O que hoje se exige é que a liderança seja voltada não apenas para os profissionais mas para as pessoas. Alguém que cruza o portão de uma empresa não deixa de ser pai, desportista, tio de alguém, um ser humano. As pessoas devem estar no centro da ação”, determina Nuno Moreira da Cruz. “Em Portugal continuamos a ser muito formais, há muito aquela ideia do arquiteto, do engenheiro e do doutor, o que não acontece, por exemplo, em Espanha. E a formalidade cria barreiras”, acrescenta. A assinalar os 50 anos da Católica Lisbon School of Business & Economics – que também serviu de pretexto para a apresentação de ontem -, o dean Filipe Santos explica que o objetivo do estudo é “perceber o que a literatura diz sobre liderança e mudanças, apresentando um questionário alargado junto de profissionais portugueses, comparando-os com líderes americanos”. “Há muitos desafios da liderança moderna: uma exigência e um cuidado muito maior do que existia no passado, em que havia muito um foco e uma visão mais de donos da empresa, muito voltados para o acionista. Hoje uma empresa tem de demonstrar um grau de preocupação com a sociedade, com os colaboradores, com as comunidades, mais diversas e inclusivas”.
“Não se olha para o negócio em sentido estrito. É preciso perceber todos os impactos que uma empresa tem na sociedade. Tem de haver um alinhamento de valor entre o acionista e a sociedade”, afirma Filipe Santos, acrescentando a importância do talento. “É hoje um recurso escasso, cada vez mais difícil de atrair e de reter.” Esta é a razão pela qual o dean da Católica-Lisbon considera que um líder tem necessariamente de ser uma fonte de inspiração. “A acrescer à ética e aos valores, deve ser mobilizador e autêntico, que esteja a servir não a si próprio mas aqueles que lidera. É este conjunto de competências que forma uma liderança responsável.”
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